domingo, 14 de fevereiro de 2010

História dos Surdos no Mundo


Bem, para conhecer a Língua Gestual Portuguesa, (ou outras Línguas Gestuais), é importante conhecer um pouco sobre a História da Comunidade Surda para perceber a evolução das próprias línguas gestuais, da educação dos Surdos e os avanços e retrocessos na forma como as línguas gestuais e os Surdos foram encarados ao longo dos séculos.


É apenas um resumo, tentei ser sintética e sei que muito mais haveria a dizer e escrever sobre a História dos Surdos, por isso, se ficarem dúvidas, estão à vontade para me pedirem mais detalhes e pormenores sobre o assunto.

E deixo também a sugestão de um livro muito bom e detalhado sobre este assunto, intitulado «História dos Surdos em Portugal e no Mundo», de Paulo Vaz de Carvalho (professor de História no CED Jacob Rodrigues Pereira), da editora Surd'Universo
.



Da Antiguidade à Idade Média

  • Os Surdos no Egipto

No Egipto, os Surdos eram adorados como deuses. Os egípcios acreditavam que transmitiam mensagens secretas dos deuses ao Faraó, que por sua vez as transmitia ao povo.

Assim, os Surdos serviam de mediadores entre os deuses e os Faraós.

Era uma forma dos faraós imporem o seu poder ao povo, legitimado por pessoas especiais que tinham ligações aos deuses.

Por serem vistos como seres estranhos com uma forma diferente de comunicar, a população em geral temia-os e respeitava-os.

  • Os Surdos na Palestina

Em 1000 a.C. surgem as 1ªs referências aos surdos na História judicial, com a Lei Hebraica (Talmude), distinguindo:

Os que são surdos e mudos;
Os que são só surdos:
Os que são só mudos.

Consoante a categoria a que pertenciam, tinham direitos e restrições específicas (ex. posse de propriedades e casamento).

Mais tarde, os romanos adoptaram esta lei.

Estas leis protegiam as pessoas surdas de serem amaldiçoadas, mas, por outro lado, impediam-nas de participar de uma forma plena nos rituais dos templos judaicos.

  • Os Surdos na Grécia

Para os gregos, os surdos não eram seres competentes, pois defendiam que o pensamento só se desenvolvia com linguagem e, para eles, só a fala desenvolvia a linguagem.

Assim, os surdos não recebiam educação: Aristóteles, em 355 a.C., defendeu que os que nasciam surdos, por não terem linguagem, eram incapazes de raciocinar.

Consideravam, portanto, as pessoas surdas que não dispunham de linguagem como não-humanas. Mas, se perdiam a audição mais tarde e falavam, já faziam parte da sociedade.

Eram também consideradas pessoas sem direitos porque não eram úteis à cidade e, muitas vezes, condenavam-nos à morte.

Eram marginalizados, juntamente com os doentes e os débeis mentais.

Os gregos tinham um ideal: atingir a perfeição física e intelectual, pelo que alguém sem audição era considerado um ser imperfeito.

No entanto, o filósofo Sócrates, em 360 a. C., considerou que era lógico e aceitável os surdos comunicarem naturalmente usando as mãos, a cabeça e outras partes do corpo, por estarem privados da audição.

  • Os Surdos em Roma

Os romanos foram muito influenciados pelos gregos, por isso, a sua posição em relação aos Surdos era idêntica.

Também viam o surdo como um ser imperfeito e indigno de pertencer à sociedade.

Lançavam as crianças Surdas, possivelmente apenas as pobres, ao rio Tibre, ao cuidados das Ninfas.

Lucrécio escreveu um poema, em cerca de 30 a.C, dizendo que os surdos não podiam ser instruídos, nem a sua inteligência ensinada

Plínio, na sua História Natural (70 d. C), refere Quintus Pedius, um artista surdo, muito talentoso, filho de um Cônsul Romano. Pedius necessitou de uma autorização especial do Imperador César Augusto para desempenhar a sua profissão.

Em 529 d. C., o Imperador Justiniano criou uma lei que impossibilitava aos surdos de possuir propriedades e impedia-os de celebrar contratos de redigir testamentos.

A lei, chamada de Código Justiniano, influenciado pelo Talmude, distingue 5 categorias diferentes de surdos:

Os que nasciam surdos e mudos;
Os que ficavam surdos e mudos em vida;
Os que nasciam surdos, mas não ficavam mudos;
Os que ficavam surdos em vida sem perder a fala;
Os que eram só mudos.

Na sociedade romana, os que nasciam surdos e mudos não tinham direitos nem obrigações. Não podiam possuir propriedades nem celebrar contratos.

Como não podiam possuir terras nem títulos, as heranças a que tinham direito passavam para os seus parentes mais próximos.

Porém, os surdos que falavam tinham direitos legais. Podiam ter propriedades, casar e redigir testamentos.

A capacidade da fala era, portanto, decisiva para o enquadramento legal das pessoas surdas.

  • Os Surdos Em Constantinopla

Em Constantinopla, os Surdos teriam os mesmos impedimentos legais de Roma, pelo Código Justiniano, que irão acompanhar os surdos por muitos séculos.

Na maioria das vezes, os surdos prestavam serviço na corte interior, servindo de pajens às mulheres.
Como não ouviam, eram explorados e assim aceites pela sociedade.
Alguns surdos serviam também como mimos para entretenimento do sultão.

  • Os Surdos na Idade Média

Santo Agostinho (354-430 d.C.) acreditava que os que tinham filhos surdos estavam a pagar pelos seus pecados.
Também defendia que os surdos podiam aprender e transmitir conhecimento através dos gestos que seriam assim equivalentes à fala para a salvação da alma.

A Igreja Católica, até à Idade Média, acreditava que a alma dos surdos não era imortal, pois eles não diziam os sacramentos. E, até ao século XII, não se podiam casar.

Em 700 d. C., em York, um Arcebispo inglês, John de Beverley, ensinou um surdo a falar. É o 1º documento acerca da tentativa de ensinar uma pessoa surda a falar, contrariando as ideias de Aristóteles e de santo Agostinho, que defendiam que os surdos não podiam ser educados.

Tudo começou quando um rapaz, que não ouvia nem falava, interrompeu o Arcebispo de York enquanto rezava.
O Arcebispo interessou-se logo, pois o rapaz pareceu-lhe muito esperto. Começou a ensiná-lo a ler e a escrever, em segredo.

Quando viu que o rapaz já conseguia dizer o “Pai Nosso”, pediu-lhe para ir à missa de domingo. Então, à frente dos presentes, o Arcebispo benzeu-lhe a língua e o rapaz começou a dizer a oração que tinha aprendido. Todos acharam tratar-se de um milagre.

Por esta razão, alguns autores consideram que John de Beverley, falecido em 721, foi o 1º educador de surdos da História.

Sem comentários:

Enviar um comentário